quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Ay flores, ay flores de verde tinto

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“Ay flores, ay flores de verde tinto”

- in Poesia Medieval do Rei D. Dinis



Sexta-feira sempre foi o dia mágico. O dia de arrumar o entulho e a roupa suja, o dia das baldas mais excelentes, e o dia de saída para quem não conseguiu fugir na véspera. Mas também havia sextas-feiras amargas, especialmente aquelas que estavam ensombradas pelo espectro negro de um serviço de fim-de-semana. Ou nem por isso. E ali estava eu a pensar nas que ia inventar para o meu serviço de sábado, quando fui avisado de que tínhamos que reunir os recos para ir combater um incêndio. «E eles sabem combater incêndios?»; «Isso não interessa» - brilhante resposta. Não interessava, o que era preciso era dar boa imagem. A Humidade mandava os seus homens (para o bar) para a frente de combate às chamas, pondo os recos e os milicianos no quentinho, enquanto os QP’s saboreavam refrescos geladinhos nos alpendres das suas moradias, comentando os fumos ascendentes que se viam lá pró sul. «Olha, Maria, deve estar ali qualquer coisa a arder». Nunca havia condutores disponíveis para nada (eram só 22) mas desenrascaram umas Ebros, meteram lá dentro os sacos de batatas e transportaram-nos para o local do litígio que opunha a Mãe Natureza ao fdp que pegou fogo às ervas. Esta breve epopeia faz lembrar aqueles anúncios na televisão: «Jovem se és ambicioso e aspiras a uma carreira com futuro, alista-te no Exército e vem catar ervas na Parada, lavar pratos, escoltar funerais e apagar fogos nas matas». A proposta era tentadora… mais ainda considerando que recebiam cerca de 4 contos por mês – uma fortuna! E ali estava eu, com o meu uniforme de camuflado colonial, faca de mato no cinturão, crachá negro de caveira com duas tíbias, e o saco das psicológicas. E claro, um par de botas 48 muito possante que servia para cavar trincheiras ao pontapé ou um túnel que nos levasse directos à Régua. Nada disso. Eu estava ali feito parvo a olhar para uma série de fenómenos desconexos à minha volta: 180 homens espalhados num campo, de mãos nos bolsos e a olharem uns para os outros, com um incêndio duas centenas de metros à nossa frente a ser debulhado pelos bombeiros. Alguém se lembrou de enviar para lá leite; «É por causa dos fumos» - devia ser, mas o certo é que o pessoal mamou o leite todo ainda sem sinais de fumo ou de intoxicações provocadas pelo mesmo. Ali ao lado estavam os paióis dos fogueteiros e isso sim, era realmente preocupante. Mais à frente tinha um campo com vinhas e o desbaste do fogo foi altamente selectivo - manchete do Jornal de Lamego: = Milagre! Fogo ataca as uvas mas poupa a vinha =. O agricultor devia era ter ido à Humidade agradecer pessoalmente com umas graciosas sacholadas na cabeça de quem de direito, que era o mais que merecido. Todo o mundo a comer uvas à fartazana, e eu também (e porque não?). Os bombeiros deram conta do recado e nós fomos trasfegados triunfalmente para o CIRE com o sentido do dever comprido.

O Exército ajuda a população!

Lamego está a salvo das chamas graças à colaboração de 180 valorosos recos!

Viva o CIRE!

Viva o Exército Português!


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«Peditório para os bombeiros? – olha pá, só tenho cinco escudos trocados; toma lá…»


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