sábado, 28 de junho de 2008

A.R.E. visita a A.O.E.

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Sexta-feira, 13 de Junho de 2008.

Arranquei no meu cournil em direcção a uma conhecida casa de reclusão, onde reside o meu confrade Viriato (nome trafulhado por razões de segurança). Entre conversas de tácticas guerreiras e alusões a fêmeas seleccionadas, percorremos os 205 km que me separavam do Templo do Deus Cabrito, na aldeia de Gralheira, Serra de Montemuro, às portas de Lamego (a cidade eterna). As nossas preces foram convincentes e o deus cabrito fez uma aparição, desaparecendo breves minutos depois numa performance mística, envolto num manto de Santa Marta (de Penaguião, tinto). Assim se cumpriu mais um ritual de Rações Especiais. De seguida mergulhamos na noite serrana e partimos para Santa Cruz onde o camarada Verídico nos transumou para a Messe para nos regarmos com alguma parcimónia (porque o dia seguinte era de festa e tínhamos que estar lúcidos). Depois de alguns copos de água, recolhemos ao Campo de Concentração de Penude onde armamos barraca e passamos uma noite ao mais baixo nível.



Sábado, 14 de Junho de 2008

A alvorada decorreu da melhor forma: ao sair da toca vi, como já não via há 20 anos, o chão sagrado do Campo de Concentração, com os olhos ao mesmo nível dos olhos dos CPC rastejantes. Fiquei cu-movido. O Viriato queixou-se.




Tivemos um breve pequeno-almoço à base de Rações Especiais e depois fomos comprar mantimentos (mais Rações Especiais) ao talho de Lalim.



(acampamento junto ao ex-libris de Penude)

(os monstros continuam a povoar estas terras)


Seguimos para Santa Cruz onde se encontravam muitos meninos e meninas, alguns vestidos de caçadores e outros com batas cinzentas cheias de etiquetas, que me fizeram recordar os dias de outrora (da grande repressão).



Tudo boa gente: carrascos e mártires, ali, lado a lado, olhos nos olhos e sorrisos verdadeiros. Vai-se lá entender esta gente. Muitas medalhas aos peitos, algumas conhecidas, como aquela do L.E.P.R.A. (Longo Estágio de Patrulhas de Raio de Acção – acho que se chamava assim), que os invejosos no meu tempo diziam ser feita de uma tampa de lata de salsichas, por ser maior que as outras de e de perímetro aparentado a circular. Na verdade, acho que o nome era outro: CSLRP – Curso de Sapatilhas do Longo Raio que o Parta (perguntem a quem por lá passou qual o verdadeiro nome, que eles insultam-vos).




No meio de tanta diversidade de trajes, também havia uns rapazes com chapéus de ferroviário muito giros (os chapéus).


Este meu relato é bastante depreciativo por mera razão de profunda inveja por nas Rações Especiais não haver nada disto; é só refugo de feira, fardas roubadas e as medalhas são aquelas nódoas de vinho e de fruta que insistem em não sair. Prosseguindo.



Os moços davam umas voltinhas, faziam de majoretes com os fuzis e, enfadados, batiam com o pé no chão. Também havia um senhor anafado sempre a tocar corneta, mas os touros nunca chegaram a aparecer.


Os espectadores enfarpelados mais velhos falavam amplificadamente com palavras, ora de verdade, ora de elogio.


(estes são os verdadeiros "sócios efectivos")

(los de arriba son gallegos)

(Lamego, cidade eterna e palco destas actividades)




Um grande amigo nosso coroou o filho, que foi o primeiro classificado na especialidade da casa.



Parabéns Camarada! (não pomos aqui o teu nome senão vamos todos presos).



Ele também foi agraciado com um novo estojo de barbear (acho eu – não sei, estava longe, não vi bem). Outros tiveram também direito a outras distinções e discursos, enquanto os estômagos roncavam silenciosamente.



Quando acabou a cerimónia, fugiu tudo em debandada para o Campo de Concentração, para um farto almoço.


Eu ainda passei pela padaria de Penude a recolher 5 broas de milho e 18 pães de mistura (tipo sêmea); foram quase 30 euros de… Rações Especiais.



Este pão destinou-se ao meu quartel privado para alimentar a minha tropa. Só contribuí com um pão e uma broa para o almoço de Penude.


Almoço?



Sete cães a vinte ossos!




Como sempre, para esta festa da AOE levo as necessárias RE’s que rego com a gasosa de produção local: a famosa Murga Bruta, que, quando fresca, supera qualquer outro elixir à face do planeta.



A ração (de saco) do dia é composta por salpicão e presunto (Lalim), pão, broa e bola de bacalhau (Penude) e a Murga Bruta geladinha.



É uma dieta espartana que contrasta com a exuberância da panela de feijoada que por lá vi a esvoaçar.


(o aspecto rosado é por causa dos morangos)

(parece um pelotão: são todos parecidos uns com os outros)


No fim do almoço (se é que teve fim), os mais corajosos inscreveram-se nas provas de destreza física habituais e lá foram para o “monte” rasgar a pele nas cordas e no mato.


(apanhado com as mãos nas botijas)

(trouxe-lhe uma lembrança, mas esqueci-me de que passaram 20 anos)

(se fosse para rastejar não apareciam tantos)

(ai que brutas!!!)

(mostrar aqui a cara pode ser uma sentença de morte)


A Velha Guarda ficou no B.A.R. (Batalhão Alimentar de Reforço) a recarregar as baterias, tendo pelo menos três deles feito o tradicional slide, que fotografei para ficar de testemunho para as gerações vindouras.


Eu não me meto nessas travessuras porque, depois de escrever uma crónica destas, já sei que se me meter nisso, eles dão-me uma corda rota e um mosquetão chinês.


(esta menina optou por uma posição defensiva)


A ilimitada vaidade do Soldado Marciano levou-o a pedir-me uma reportagem quase semi completa da sua prova militar.


Ele que na sociedade civil exerce a actividade de curandeiro místico móvel, demonstrou que não tem pernas para estas andanças, o que permitiu que o acompanhasse com relativa facilidade.


Esta reportagem destina-se a comprovativo para efeitos de esposa desconfiada.


(o meu pensamento está com as Rações Especiais)

(olha o gaijo a pôr a roupa a secar!)

(camuflagem total)

Enquanto eu corria pelos montes e vales do condado de Arneiros, o Viriato punha a conversa em dia com o Ranger Bugalho, sempre iluminados por poderosas lamparinas escocesas.


(o meu LG40 ainda funciona)


Ao fim da tarde o espírito RE voltou a prevalecer sobre o OE e a necessária relação com o espaço geográfico impeliu-nos a revisitar os cenários de guerra e martírio de outrora.



Acompanhado do operacional Viriato, fomos até à ponte de Reconcos recordar aquela doce cantiga: “todos os patinhos sabem bem nadar…” que um dia nos gravaram no cérebro a ferro e água.



O fim de tarde estava fabuloso, com uma luz de trovoada e uma serenidade campestre que estontearam os meus scanners portáteis.



Subimos à Serra das Meadas e fartámo-nos de navegar estrada fora, num verdadeiro mar de buracos, com uma paisagem a fazer esquecer a forte ondulação.


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Descemos a Lamego e subimos a Santa Cruz, onde jantamos um suculento arroz de destroços, a fazer lembrar as conservas do INEM.
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Eu só enchi o prato três vezes (espírito RE), e o sabor da sopa com a colher a raspar em prato de aço, transportou-me logo para 1987. Uma verdadeira máquina do tempo.



Seguiu-se bolo de Aniversário AOE (não tinha velas mas foi de vela), brinde, boa disposição, entrega de medalhas aos participantes nas actividades da tarde e café no B.A.R. das catacumbas.


Fiz uma romagem ao Parque Auto e às Secções de Trans e de Sobras para recordar estranhas vivências, e de seguida desertei para casa com vontade de ficar.



Tivemos pois uma grande festa AOE, mas comigo foi o espírito RE que prevaleceu. Senão vejamos. Dois dias de festa – 6ª à noite e sábado (RE); jantar de 6ª em opção livre (RE) com requinte gastronómico (RE); aquisição de géneros alimentícios e bebícios locais (RE); almoço de RE; passeio pelas redondezas (espírito RE); e claro, nada mais RE que a real presença do General Viriato a meu lado (meu fiel súbdito).




Tal como na história das guerras peninsulares contra os romanos, este meu camarada foi muito mal tratado (diz ele). No seu tempo ele era “O” – e depois vinha o seu nome de guerra (que aqui trocamos por um pseudónimo literário para evitarmos problemas com certas leis injustas): Viriato [aliás escolhido por motivos óbvios]. Tirando o “Ó” da messe, ele era o único “O” [a ler-se “ú”, claro está].



(em cima: bancos para partir o pandeiro)


O que é certo é que já nos tempos da nossa guerra ele se endeusava e era adorado e seguido por uma multidão de fiéis discípulos. Os anos foram passando e a aura mística manteve-se. O divino Viriato não exige vénia, mas gosta de ser identificado e de ser tratado com aquele toque peculiar que todas as divindades merecem. Acontece que nesta visita a Penude, o Viriato era apenas mais uma presença, acocorada na minha vasta sombra, remoendo murmúrios e lamentações pelos (não) tratos recebidos. As frases que de seguida cito são dele e reflectem a profunda dor que ele sentiu naquele verdadeiro calvário:

«Eu aqui era um senhor»;

«Hoje senti-me perdido»;

«Não estou habituado a que me tratem assim aqui»;

«Pró ano só venho se vier outro dos nossos»;

«Vamos bazar».



Salvou um pouco a situação a longa conversa com o Ranger Bugalho, já anteriormente mencionada. Penso que esta dificuldade de integração é mais uma consequência do desnivelamento existente entre a AOE e a ARE. Penso também que com mais umas cervejas frescas essa diferença seria rapidamente corrigida.



O balanço da Confraternização foi, a meu ver, muito positivo, apesar da fraca adesão da Família Ranger (agora as guerras são outras). Na verdade, se para mim uma ida sozinho a Penude tem sempre um balanço positivo, muito maior será na companhia de tão bravos heróis.




Até pró ano!!!


Um comentário:

Anônimo disse...

Depois deste "post" faço questão de salientar, que foi um prazer ter estado à mesma mesa, a conviver e a privar com toda a familia Ranger, especialmente com os Veteranos, pelos quais nutro o maior respeito e simpatia.
E espero que apesar destas brincadeiras (isto é tudo inveja!)possa igualmente ter lugar à mesa no próximo convívio.
A todos.. os meus melhores cumprimentos!!
E já agora.. para que não se percam os bons hábitos - esta é para ti Cyptus:
10 de braços!!

Viriato